segunda-feira, 31 de maio de 2010

Virada Cultural de São Carlos

"Criar raiz
E se arrancar"
("Na Carreira" - Chico Buarque e Edu Lobo)



Caroline
Estrangeira das companhias, minha parada foi na Cia Bubiô FicoLô.
Três intervenções na Praça Coronel Salles, em São Carlos, com um parceiro novo e desconhecido: Dario, o nome dele quando disfarçado de gente. Treco, palhaço-perna-de-pau. Mal deu tempo para “oi, muito prazer” corremos para a Praça, chegamos às 20 horas, a primeira intervenção seria às 20h30min, depois do show do Vanguart.
Troca de roupa, maquiagem, e lá estávamos nós do jeito que gostamos de estar: Severina e Treco estavam prontos. Saímos do camarim assim que o show terminou, e na beira da escadaria, o moço que anunciava as atrações nos viu e com sua humilde voz anunciadora, nos apontou e a praça toda nos olhou: Meu Deus! – tremi toda – o que vai acontecer?
Como todo palhaço cara de pau, não preparamos nada antes, Dario me mostrou coisas que sabia fazer (um tanto bom de mágicas), eu contei a ele as minhas idiotices e tentativas. Era o pulo no abismo.

Severina
Estar ao lado de alguém de 3 metros ou 9,84 pés ou 3,28 jardas, é algo realmente grandioso, no auge do meus 1 metro e 60 centímetros, ninguém me notava.




PhD em TPM, dei um jeito na história e quando percebi havia uma roda em volta de nós. Treco mostrou suas habilidades malabaristicas enquanto eu fazia malabares com minha inabilidade, enrolei todo mundo, é necessário muito preparo, para chegar a esse nível de cara-de-pau. Treco propôs ao público um número muito forte para as emoções: A TRANSFORMAÇÃO. Três homens, bastante gentis, se candidataram para o experimento. Dois deles teriam a nobre função de segurar o pano, evitando que o público ficasse chocado com o que atrás do mesmo, aconteceria. O público não viu, mas eu vi: Vi quando o rapaz gentil começou a criar um cabelo parecido com uma peruca e no lugar de olhos, óculos plásticos parecendo aqueles que encontramos em lojas de 1,99... Foi o tempo das palavras mágicas e o pano caiu e aquela COISA surgiu. Não era mais o rapaz, era outra COISA. Treco intrigado e com Tico e Teco confusos quis porque quis descobrir se a coisa era homem ou mulher ou as duas coisas, e me deu essa função. Dentro da minha super sacola super habitada encontrei então dois paninhos mágicos que me ajudariam nisso... A COISA deveria prosseguir da seguinte forma: Deveria amarrar os dois paninhos com toda a força existente em seu ser, eu colocá-los-ia próximos ao seu coração para que os paninhos pudessem ouvir seus segredos, e os dois assistentes que antes seguravam o panão (tradução: pano grande) tiveram mais uma nobre função: Puxar os paninhos do coração da COISA.
E 1 e 2 e 3
Puxaram.
...
...
Um sutiã?
Os paninhos não só ouviram o segredo do coração da coisa, como trouxeram uma prova de sua feminilidade.
Agradecemos aos voluntários desconversando, escondendo o sutiã e nos despedimos, porque de longe, Treco avistou Ed Motta disfarçado de não ser ele, conversando com os amigos. Depois de um papo breve com Ed e lembranças ao seu papai Tim Maia (viva a licença poética, Caroline diz) descobrimos que haviam mais celebridades pela praça. Encontramos Vanusa tomando coca cola, Jacob (lobisomem do filme Crepúsculo), Marcelo Camelo e Malu Magalhães e até Rauzilto. Foram muitas emoções!
Começou o show do “The Deads Rock” e voltamos ao camarim.



Caroline
Retocar a maquiagem, alongamento, comer uma maça para não perder a voz e não conseguir resistir à brincadeira.

Severina
No camarim ao lado estavam os meninos do Vanguart, Treco me ajudou na missão: Fotografá-los para ganhar dinheiro. Treco tremeu na base, as fotos ficaram tortas e fui flagrada pelo produtor. Em frente ao espelho outra idéia sensacional ocupou meus pensamentos: Tentar fazer parte da banda! Penteado emo-folk-rock-and-roll, uma cadeira disfarçada de guitarra e a coragem. Fiz meus solos mais bonitos e eles não me deram bola, até o momento que surgiu Hélio (vocal, violão, gaita e futuramente trompetista da banda), bastante surpreso com minha habilidade em tocar cadeira, me propôs uma nova banda, de cu jazz, um palavrão conceitual, apostei nele e começamos nosso som. Era impossível não se emocionar com nosso som. Treco ficou nos rodiando, como cachorro olhando o frango girar nas padarias da vida, e no momento preciso: FIIII... Apitou seu apito, e juntos: Hélio e eu, eu e Hélio, descobrimos que era isso que faltava, Treco entrou pra banda. Que alegria. Fizemos mais uma música para a alegria daqueles que sonhavam com a gente (já que ninguém nos notava) e nos despedimos: Essa foi a banda que durou menos tempo na história de toda a música. Com o coração nas pontas dos dedos, acenamos tchau: Já era hora de brincar na praça.



A roda cresceu em gente. Aquela coisa redonda, os olhos em nós, o Hip Hop a todo vapor nas caixas de som, fui mostrar minha habilidades no Break. Ossos travados e músculos torcidos, o público vibrou, queriam mais, era a vez de Treco que não podendo enroscar suas pernas GGMG (grande, grande, muito grande), fez as bolinhas de malabares dançarem.
O que é isso?
Quem são esses?
Dois malabaristas invadiram a roda! Que maravilha. Vieram dançar com suas claves e fazer o público sorrir e quando a gente achava que era o fim, era só o começo: Os garotos (e uma garota) da dança de rua vieram brincar também! Rodavam com a cabeça no chão, faziam coisas que parecia que ia acabar em nó. O público gritou, vibrou, pediu mais e o show “Qual é o seu talento?” acabou numa parceria de Severina (essa que voz fala) e Paulo num desafio de Break. Acabei no chão, dei um nó em mim mesma. Arena limpa do meu corpinho, Treco e suas luzes mágicas emocionaram todo mundo. Partimos outra vez.

Caroline
"Voltar quase sempre é partir
Para um outro lugar"
("Samba do amor", Paulinho da Viola / Elton Medeiros / Hermínio Bello de Carvalho)


Severina
Treco fez uma confusão danada com as pessoas e panos verdes e panos amarelos e bandeira do Brasil. Uma confusão tão confusa que confundiria todos vocês se eu tentasse explicar. E depois de tanto confusão, a hipnose via HI FI que fiz, foi toda atrapalhada, o beijo que deveria ser na minha bochecha, veio parar na minha boca (Valeu Barbudo!!!!!!!!!). Sendo eu uma pessoa séria, guardei meus sorrisos e toda minha alegria e como uma bela francesa, parti para a multidão. O relógio da igreja apitou, a noite já era começo de outro dia. Partimos outra vez, agora uma partida mais melodramática e sonolenta: Era nosso até-outro-dia-se-a-estrada-quiser.
Fiz novos amigos, montei e desmontei uma banda, ganhei novos hematomas. Com minha sacola de feira carregada de lembranças, parti pela estrada feliz da vida, querendo logo chegar a outro lugar pra inventar outras brincadeiras. Que a estrada me queira sempre bem: Caminhante.

Fotos de Mariana Paudarco.

quinta-feira, 27 de maio de 2010

- “A época do caju chegou.
A época do caju foi embora.
Você não apareceu.
Chorei pensando que não vinha mais.”
(Irma, minha amiga do Vale do Catimbau)


Estou em Recife desde o primeiro dia do ano. Vi a maré encher e a maré baixar por vezes incontáveis, vi a cidade toda começar a se enfeitar para o carnaval, encontrei amigos inesperados e amigos que eu estava cheia de saudade no peito, vi e vivi muitas coisas e dentre essas coisas vi também a Cia Parati pousar nessa cidade que é metade de mim. Entre se adaptar, arrumar, encontrar e caminhar, num dia inesperado eu estava ali, no meio da ‘companhia’ abrindo uma roda no Parque da Jaqueira. Nada combinado: Aconteceu.
Passei a ser uma integrante temporária: Toda inteira, com meu figurino diferente , destoando, desequilibrando, mas junto.



Nos tempos livres, de cara limpa, íamos juntos repensando e refazendo coisas, adaptando, inventando. Ficamos todos os cinco juntos? Qual o desejo de cada um? E se nos separássemos? Pronto!
São dois pra lá e dois pra cá, igual valsa, mas num desses dois cabe mais um: Que era eu.
Divididos e juntos.
Gaiato e Zuza.
Cavaco, Tamis Liudis e Severina.
Fomos para a vida, com a cara (pintada) e a coragem. Era um recomeço para eles e um começão para mim. Aonde tudo isso ia dar?



Em Boa Viagem, aquele casal do prédio ao lado da Praça:
“Vimos da Janela que vocês tinham chegado e descemos correndo. Agora vamos para casa ver o fim da ‘Fazenda’.”



No Parque da Jaqueira, o segurança que para sua ronda e fica sorrindo escondido, depois disfarçadamente continua seu trabalho como se não tivesse encontrado nenhum palhaço no caminho.



E chegou o grande dia! O dia que por mais de um ano, é por mim, o dia mais esperado.
A travessia até o sertão.
De Recife a Buíque.
Com nossas malas e corações partimos.
Marília no volante. Amiga querida, fotógrafa, palhaça de alma.
Primeira parada: Feira de Caruaru. Para uma possível roda que não aconteceu. Pouca gente, muito sol. Almoçamos na casa da Marília, e eu, cai doente. Febre mais quente que o sol, frio que não se sente por aqui. Dormi por duas horas, era preciso partir. Saímos em direção a Pesqueira, cidade que onde mora meu pai.



Com a noite chegando chegamos a Pesqueira, a última cidade do Agreste. Eu, e minha ressaca de febre, não agüentei sair de casa, fui dormir enquanto Anderson, Tâmara e Marília foram desbravar a cidade.



Eles fizeram uma roda e foram até dar uma entrevista na Rádio Comunitária Urubá, isso fiquei sabendo meio sonolenta, quando voltaram para casa.
No dia seguinte, bem cedo, nos arrumamos e enquanto colocávamos nossas bugigangas no carro as crianças da rua da casa do meu pai (no Bairro Central) começaram aparecer. Muitas.



Combinamos com elas que dali uma hora aconteceria uma brincadeira por ali. Fomos para o centro da cidade, demos uma volta pela feira e seguimos para a Praça Jurandir de Brito, Tamis Liudis conseguiu uma carona e nós fomos a pé.



Abrimos uma roda para as pessoas que ficam esperando a Toyota para levá-las de volta ao sítio.



De volta ao Bairro Central meu coração quase parou. As crianças que nos abordaram assim que amanheceu o dia estavam nos esperando na rua, e a maioria delas com o nariz pintado de vermelho, esperando a brincadeira.



O sol já estava de rachar o coco do Palhaço. Em busca de uma sombra encontramos um beco, com uma faixa de sombra, onde as crianças cabiam. E simbora brincar.



Meu coração ficou repleto de alegria, de repente tudo passou a fazer mais sentido do que nunca. A brincadeira só acabou porque Tamis Liudis ficou nervosa e quando fica desse jeito ela não para de soltar pum. Todo mundo correu para se proteger, cada um escondido em sua casa e Tamis Liudis direto para o banheiro.
Coração na mão seguimos em direção ao nosso destino final: Buíque – Vale do Catimbau.
Depois de 1 hora e meia de viagem encontramos a estrada de terra que nos levaria ao Vale... Eu tremia toda. Por quê?
Sim... Em Janeiro do ano passado estive por lá, de cara limpa, para conhecer e encontrar. Fiz dois grandes amigos: Lomé, guia da Reserva do Vale do Catimbau fazedor de mel e Irma de oito anos. Irma foi a melhor companhia no tempo que estive por lá e antes de minha partida me levou ao Cajueiro e me entupiu de caju. Disse a ela que voltaria para o ano.
Voltei exatamente do jeito que queria: Para brincar!
Os 20 km da estrada de terra pareciam não ter fim. Enfim, chegamos.
Corri para ver Irma e quando nos encontramos foi só sorriso e abraço.
- A época do caju chegou. A época do caju foi embora. Você não apareceu. Chorei pensando que não vinha mais.
Não pude dizer nada.
Na parede da casa dela tem pendurada uma foto da Severina que Marília deu de presente a ela quando esteve por lá no Inverno passado.
Passamos a tarde toda juntas, com Marília, Jamile e Lívia também. A brincadeira já tinha começado. E a tarde voou, o sol se acalmava na beira do céu quando Cavaco, Tamis Liudis e Severina saíram para chamar as pessoas até a praça.



Brincamos até a noite cair e tudo ficar bem escuro. As crianças se manifestavam em cada gesto, cada tropeço, cada tapa e nós nos divertíamos tanto quanto elas.



E com a noite nos mandando para casa nossa travessia terminou. Aos poucos e demoradamente as crianças foram voltando para as suas casas. Irma me abraçou com os olhos de lágrimas e levou embora com ela um pedaço grande de mim. Fiquei em silêncio até perder de vista, dentro de mim era um turbilhão. Ali, nas areias do Vale do Catimbau encontrei a mim, o meu caminho, senti a maior alegria que nunca senti e nem sei explicar porque era a soma de tudo de mim, e foi assim, com meu coração repleto de amor que terminou meu ciclo com a Cia Parati.
Obrigada por essa parceria e por essa travessia que juntos fizemos.



Fotos de Marília Chalegre
(postado originalmente em fevereiro de 2010)

Quem é a Cia Parati?
A Cia Parati nasceu com o encontro de quatro amigo-artistas: Anderson Machado, Felipe Andrade, Rafael Napoli e Tâmara Lima, que se conheceram no PFPJ (Programa de Formação de Palhaços para Jovens) dos Doutores da Alegria. Em Dezembro de 2009 eles partiram numa Parati rumo à Paraty no Rio de Janeiro com um espetáculo de rua na bagagem. Ficaram um mês na cidade fazendo apresentações nas praças. Em Janeiro de 2010 partiram para Recife (a Parati ficou para trás) para realizar o mesmo trabalho. E lá nos reencontramos e nos juntamos para essa aventura narrada.
Blog da Cia Parati